MMichalski Music News

terça-feira, 29 de abril de 2014

Somos todos o que?

A cada novo post, este espaço se torna palco de questões muito mais sociais e filosóficas do que musicais ou técnicas, como era a proposta do Blog.

Porém, assim caminha a humanidade... Realmente não tragos tais questões aleatoriamente, mas sim em virtude dos debates que surgem nos meios de comunicação. E como todo mundo gosta e pode dar sua opinião, por pior que ela seja, eu também posso.

Realmente acho que está na hora das pessoas pararem (de fato, pararem) e pensarem (isso é um pouco mais difícil, mas não menos necessário) no rumo que tomamos. A humanidade estaria no caminho certo? Eu diria que não, e as consequências serão catastróficas. Para mim, somos um bando de lemingues em direção a um precipício.

A analogia que faço entre o comportamento dos seres humanos e desses pequenos roedores vem bem a calhar com o debate da moda: somos todos macacos?

Não é de hoje que os seres humanos, no topo de sua arrogância, prepotência e egocentricidade, denominam seus semelhantes com nomes de outros animais a fim de designar, na maioria das vezes de forma pejorativa, alguma característica particular.

Vaca, galinha, burro, jegue, jumento, anta, baleia, elefante, macaco, piranha, cavalo, porco, rato, cobra, carrapato, ariranha, veado, são alguns exemplos que ouvimos no dia a dia. A própria expressão generalizada, "animal", já é um exemplo.

O interessante é que os seres humanos esquecem que nós somos animais. Somos uma forma de vida que habita este planeta. Simplesmente uma outra forma de vida. Não somos melhores ou piores do que uma barata ou um golfinho, ou uma ameba ou um flamboyants. Somos apenas diferentes. Ligeiramente diferentes. Nossos mapas genéticos não ligeiramente diferentes. E mesmo quando abordamos a questão evolução, é questionável dizer que somos os seres mais evoluídos do planeta. Evoluídos em que sentido?

Porém, para os seres humanos, na maioria das vezes, os outros animais são vistos como formas de vida inferiores. E esta tese é defendida através de várias linhas filosóficas, religiosas e até mesmo biológicas. E, principalmente, no jargão popular.

Então, quando um ser humano evoca o nome de alguma outra espécie para nomear um semelhante, ele não está (geralmente) elogiando, mas sim inferiorizando. Porque se a pessoa tem hábitos de higiene questionáveis para a sociedade, é um porco, que é um animal inferior. Se a pessoa tem uma opção sexual homossexual, é um veado, que também é um animal inferior. Se for uma mulher que possui muitos parceiros sexuais, é uma piranha. E se é negro ou de origem afrodescendente, é um macaco.

Gostaria de enfatizar aqui um ponto que considero importante. Para o leitor menos atento, talvez o fato de serem usados simultaneamente os termos negro e afrodescendente não cause estranheza. Mas, para um leitor mais crítico, pode parecer uma redundância. Mas não é. Devemos lembrar que a população do continente africano é, em sua maioria, composta por negros, mas também existem grupos de brancos no continente, principalmente no norte do deserto do Saara. São árabes, berberes, tuaregues, brancos, entre outros.

Além disso, não encontramos negros apenas na África. Existe, por exemplo, uma enorme população de negros na Índia, talvez a maior população negra em um único país no mundo. E estão lá há milhões de anos. Portanto, chamar um negro de afro descendente é uma generalização preconceituosa e ignorante.

Observação feita, vamos retornar a questão central deste texto: e afinal, somos todos macacos?

Bom, nesta altura do campeonato, se no jargão popular chamar um ser humano com o nome de algum bicho significa querer inferiorizá-lo, então não podemos ser todos macacos. Evolutivamente, somos sim, primatas. Mas não somos macacos.

Ao defendermos esta bandeira, não estaríamos combatendo o racismo que existe em chamar alguém de macaco. Generalizar o termo e chamar qualquer pessoa de macaco, seja ela branca, negra, amarela, parda, vermelha ou azul, não estaria tirando o peso preconceituoso da expressão. Estaríamos nivelando por baixo, simplificando o problema, e sendo extremamente hipócritas. Sim, porque nenhum ser humano é um macaco. Nenhum ser humano deve ser inferiorizado diante de seu semelhante. De repente colocar todo mundo no patamar inferior não devolve aos negros e afrodescendentes sua posição de igualdade com os demais povos.

Pior ainda: esse mau hábito de "nivelar por baixo" é uma das maiores hipocrisias da humanidade. Quando nivelamos por baixo, não damos aqueles que foram sempre inferiorizados a chance de crescer, se desenvolver, de ganhar sua importância, de alcançar seus objetivos. Ao mesmo tempo, não tiramos do que já estavam por cima seus direitos. Portanto, tudo fica muito bonito da boca para fora, nas hashtags e redes sociais, mas no fundo, continua tudo igual.

Sim, somos todos iguais. Todos somos seres humanos. E somos todos diferentes. Cada um é um indivíduo. E não somos todos macacos. E duvido que um macaco ficaria muito feliz ao ser chamado de gente, considerando a forma como vivemos. Somos seres humanos. A rigor, nem piores ou melhores do que um macaco. Apenas diferentes.

Devemos sempre lembrar que o preconceito está nas atitudes e não nas palavras. Quando não enxergamos desta forma, estamos simplificando a questão, perigosamente. Como uma criança diante de um prato de sopa, ficamos preocupados apenas com as poucas letrinhas que parecem na superfície, mas nos esquecemos de todo o conteúdo que existe na base do prato. Só alcançamos este conteúdo se estivermos dispostos a ir fundo com nossa colher, cavucando e remexendo, sem medo do que possa aparecer.

Seguimos tudo o que achamos bonito, sem pensar realmente a respeito das questões. Queremos nos manifestar, mas não temos base. Falamos a primeira besteira que nos vem à cabeça. E desta forma continuamos uma grande boiada. Ou melhor, um bando de lemingues em direção a um precipício.

Lemingues hipócritas. É isso que nós somos.

Abraços,

Miguel Michalski.