Durante essa semana estive mais
ausente das redes sociais do que o normal, devido ao meu trabalho, mas nem por
isso deixei de notar algumas notícias que me levam a pensar: estaria a música
popular brasileira no fundo do poço? Teríamos finalmente alcançado o que podemos
fazer de pior?
A música popular brasileira a
qual me refiro não é exatamente a MPB autêntica, estilo musical que começou a
surgir na década de 60 com a Bossa Nova e as músicas folclóricas e de raízes
brasileiras, e que com o tempo se fundiu a outros estilos, como o rock, o
reggae, o samba, dando origem a uma série de estilos musicais, como o
samba-rock e o samba-reggae, por exemplo.
Mas, ao mesmo tempo, o que
circula na boca do povo hoje deve ser considerado a “nova música popular
brasileira”. Ou seja, o que é pop em
território nacional e foi “fabricado” por aqui, está no bolo.
E as comparações são
inevitáveis...
Bom, eis algumas das notícias as
quais me referi:
- “Sambista Dicró morre em Magé, no Rio, vítima de infarto”;
- “Michel Teló é comparado a Vinícius de Moraes e Tom Jobim”;
- “Valesca Popozuda e Mr. Catra lançam pagode pornográfico”.
Aparentemente, nada tem haver com
nada. Mas apenas aparentemente...
Dicró foi um dos “três malandros”
do samba carioca. Grande sambista, cantor e compositor, teve com os sambas
satíricos, em especial aqueles que falavam mal da sogra, seus maiores sucessos.
Sua música tinha graça, humor, e,
embora possa ser considerado politicamente incorreto nos padrões atuais, o seu
politicamente correto é tão bem feito que pode ser perdoado até pela própria
sogra.
Descanse em paz Dicró!
Sem querer comparar ou medir a
grandiosidade de cada um, Dicró, Vinícius e Tom (citados nas notícias) são
verdadeiros representantes da música popular brasileira. Cada um em sua zona de
conforto, cada um com sua realidade social, mas livres de qualquer preconceito
nos dias atuais. São mestres, ninguém pode negar.
O Miami Herald é um jornalzinho
americano que circula por alguns cantos da Flórida, Carie e América Latina...
Até aí necas... Mas me vem o Miami Herald publicar uma matéria em que simplesmente
se coloca o seguinte: “Indeed, Ai Se Eu Te Pego may
be the most popular song to come out of Brazil since The
Girl From Ipanema”.
Ou seja, “Ai se eu te pego” é
nosso segundo maior produto exportação (o primeiro são jogadores de futebol)...
Descanse em paz Tom, descanse em
paz Vinicius...
E a derradeira!
Valesca Popozuda e Mr.Catra são
uma dupla de funkeiros, cariocas, chegados a uma polêmica. E talvez isso seja o
que eu tenho de melhor a dizer sobre eles...
A nova polêmica da dupla é uma
música a qual não tenho como classificar, já que não tenho nada abaixo de “lixo”
na minha escala...
Valesca publicou em seu twitter
esta semana que “estava gerando polêmica porque havia largado o funk para
cantar pagode sem palavrão”. E publicou um link para tal música...
Bom, palavrão não falta. E, quando
uma música chega a ter a tag “proibida para menores de 18 anos”, ela tem algo mais
do que palavrão... Eu realmente pensei, quando escutei a tal música (sim, eu escutei...): "Como alguém tem coragem de cantar isso?" e também: "Como alguém tem coragem de gravar isso?" e pior: "Como alguém tem coragem de tornar isso público?".
Sei que acabo fazendo propaganda
ao escrever sobre essa música aqui... Ainda mais quando o “fale mal, mas fale
de mim” virar estratégia de marketing totalmente válida nas redes sociais e
blogueira com mais desafetos do que palavras em seu blog virou atração de
programa de TV... Mas, a tal música e as notícias vinculadas a mesma não
poderiam passar despercebidas.
Vocês irão escutar essa música,
querendo ou não. Podem estar certos disso...
É bom esclarecer que não tenho
nada contra um MC, Michel Teló ou uma popozuda. Muito menos algo contra a tal
blogueira. E não são eles a origem da ferida, enorme, presente em nossa
sociedade que quero cutucar.
Também não sou contra músicas de
duplo sentido ou que falem de temas picantes. Estou ouvindo enquanto escrevo
esse post “Sexo”, disco de 1987 do grande Ultrage a Rigor. E do funk ao rock,
passando pelo samba e o pagode, sempre teremos alguém querendo abordar um tema
mais provocante.
Não sou contra o funk carioca, que
nos bons tempos foi sem dúvida uma das maiores e melhores formas de expressão
do povo carioca oriundo dos guetos e favelas.
Não sou contra o sertanejo,
música caipira ou mesmo o sertanejo universitário. A música sertaneja vem da
realidade do homem do campo e canta um Brasil que pouca gente escuta.
Na verdade, as diversas formas de
expressão que temos na forma de música são verdadeiros reflexos do povo que as
alimenta, produz e consome.
Se você é um pagodeiro que gosta
de uma manguaça, vai falar sobre bebida em suas músicas. Se você é um vaqueiro
que fica dias e dias sem ver a mulher amada, vai cantar músicas sobre “dor de
corno”. Se você é um roqueiro satânico que curte um pretinho básico, vai cantar
sobre as sombras. Se você é um morador de favela, oprimido por sua condição social
e reprimido pela violência, você vai cantar sobre tiroteio, polícia e drogas.
Entenderam a lógica, não foi.
E sobre isso, não vejo qualquer
problema...
Afinal, em todos os casos existe
um ímpeto interior em cada exemplo de indivíduo citado que o leva a se
expressar de alguma forma.
Quem ouve tem a chance de
escolher se concorda ou não, se gosta ou não, se vai consumir ou não as ideias que
aquele indivíduo apresenta. Vai sentir, ou pensar, que a sua realidade pessoal
pode ser refletida de alguma forma na realidade daquele individuo que se expressou
com a música.
O controle de qualidade, o bom senso e o bom gosto serão determinados democraticamente...
A arte produzida por um ser
humano reflete o que ele é, o que ele pensa. Quando a expressão artística de
uma pessoa se torna um produto consumido pela massa, pode se dizer que a sociedade
vê sua realidade e seus valores refletidos nessa expressão.
Porém, o que mais vejo hoje, pois
notícias como as que apresentei aqui não cansam de aparecer, assim como músicas
cada vez piores, é um povo consumindo um grande e total vazio de ideias, de
sentido, de significado. Um grande nada...
A massa se move em direção ao
nada...
A sociedade está consumindo o
nada. A sociedade vê um grande nada em sua realidade e seus valores.
Hoje, mais do que nunca, acredito
que a sociedade contemporânea tenha não mais valores distorcidos, ou ideias distorcidas,
ou princípios distorcidos... Temos um grande nada de valores, ideias ou
princípios. E a nossa música popular está aí para mostrar isso...
Talvez pela facilidade em se
propagar, a música popular seja um dos melhores termômetros sociais
disponíveis...
E hoje, temos “orgulho” em ver
que nosso maior produto popular de exportação é “Ai se eu te pego” e que a
realidade de cidades como o Rio de Janeiro se baseia em bundas e outros órgãos
relacionados ao sexo.
Sabem à conclusão que eu cheguei?
Dicró preferiu enfartar a ouviu o pagode da dupla funkeira ou ler o Miami
Herald...
Abraços,
Miguel Michalski.
PS: Não quis deixar links neste post... Me recusei... Googlem e você terão o que procuram...
Excelente post! Adorei!
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